Especialistas preveem o surgimento de novas variantes do coronavírus ainda nos próximos meses, driblando a imunidade garantida pelas vacinas. Trata-se de um estudo realizado por pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP, em parceria com o Instituto de Química (IQ) da USP e o Hospital Sírio Libanês.
O trabalho é resultado de mais de 150 artigos sobre o sars-cov-2, com análise de diversos aspectos, como o potencial de mutação, a capacidade do sistema imunológico, a transmissibilidade e a eficácia das vacinas. A principal conclusão é que não devemos deixar o vírus circular, como afirma Cristiane Guzzo, professora do departamento de Microbiologia do ICB e pesquisadora principal do artigo.
"A tendência é que as pessoas comecem a se infectar novamente e aí ficaremos sujeitos ao surgimento de variantes ainda mais contagiosas e fortes do que as que conhecemos, o que diminui a eficácia das vacinas. Como não temos como prever como será a evolução da pandemia e como as novas variantes vão se comportar, todo o cuidado ainda precisa ser feito pela sociedade de forma a evitar a circulação do vírus”, destaca a pesquisadora em entrevista ao Jornal da USP.
Variantes ainda mais perigosas
O estudo mostrou que o coronavírus é ainda mais mutável do que se imaginava, o que afeta diretamente a capacidade dos anticorpos humanos reconhecerem o vírus. As mutações também têm feito com que o contato entre vírus e célula humana seja maior e assim as contaminações aumentem, burlando o sistema de proteção criado pelas vacinas.
Além das proteínas Spike, localizadas na superfície do vírus, outras proteínas do coronavírus também estão se modificando, como mostrou o estudo. Uma das consequências é o aumento da taxa de multiplicação do vírus nas células humanas. “Por esses e outros fatores, o vírus vai aprendendo a driblar a ação dos anticorpos e se adaptar ao ser humano”, acrescenta Cristiane.
Há o alerta ainda para a possibilidade de o sars-cov-2 evoluir a ponto de atingir a capacidade de infectar outras células, além das células pulmonares. “O grande medo seria a infecção, por exemplo, de células neurológicas”, afirma a especialista.
Mutações ainda mais transmissíveis
O estudo observou que o período em que as pessoas começam a transmitir o vírus tem se iniciado cada vez mais cedo conforme as variantes surgem, antes ainda do início dos sintomas.
“Vimos que 74% das transmissões pela variante Delta foram feitas por assintomáticos. Na variante original, as pessoas começavam a transmitir o vírus um dia antes do início dos sintomas. Já na Delta, isso passou a acontecer com dois dias de antecedência. São detalhes que mostram que o vírus está evoluindo na sua capacidade de se esconder em nosso organismo. O que também pode estar relacionado com o aumento na gravidade dos casos e na taxa de transmissão”, detalha Cristiane.
A especialista conta que, além de mais cedo, as variantes transmitem mais. Uma pessoa contaminada com o sars-cov-2 original transmitia, em média, para duas pessoas. Com a variante Delta esse número passou para cinco. Com a ômicron, essa taxa varia entre sete e dez contaminações.
Como evitar que novas variantes apareçam
Como destaca Cristiane, as vacinas que temos hoje impedem a mortalidade e os casos graves da doença, mas não conseguem impedir que o vírus circule. Portanto, não impedem o surgimento de novas mutações.
Recentemente, a Organização Mundial da Saúde (OMS) expressou que o coronavírus segue com o status de emergência à saúde pública devido a sua evolução imprevisível, assim como apontou o estudo da USP e do Hospital Sírio-Libanês.
Para Cristiane, todo o cuidado ainda precisa ser feito pela sociedade de forma a evitar a circulação do coronavírus. “Precisamos tomar as doses de reforço da vacina, evitar aglomerações, manter a utilização das máscaras, a higienização das mãos e manter os ambientes ventilados”, enfatiza.
“Assim, evitamos uma nova onda, postergando o surgimento de novas variantes de preocupação até que possamos descobrir medicamentos eficazes contra a covid-19 e imunizantes, que possam bloquear a infecção e a transmissão viral, além de ativarem a produção de anticorpos que permaneçam por um período mais longo de tempo no corpo humano”, finaliza a pesquisadora.
Fonte: Jornal da USP.