No dia 6 de abril comemoramos o Dia Mundial da Atividade Física, data criada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). O objetivo é combater o sedentarismo e conscientizar a população sobre os seus riscos. De acordo com o Ministério da Saúde, cerca de 47% dos brasileiros adultos não chegam a praticar os níveis de atividade física recomendados pela OMS. Esse mau hábito está diretamente associado com o risco aumentado de surgimento de um câncer.
O jornal científico Cadernos de Saúde Pública indica que 72,5% das pessoas diagnosticadas com câncer no Brasil relataram possuir uma vida sedentária. Esse dado fica ainda mais evidente no recorte por gênero e idade. Isso porque as neoplasias são mais comuns entre as mulheres de 40 e 59 anos e em homens após os 60.
Pandemia e maus hábitos de saúde
Para o médico oncologista Dr. Carlos Gil Ferreira, diretor médico do Grupo Oncoclínicas e presidente do Instituto Oncoclínicas, é possível observar um cenário de constante aumento do número de doenças oncológicas. Segundo ele, a situação se agravou a curto prazo em consequência dos efeitos da pandemia nos hábitos de vida da população.
“Análises prévias já apontam que o isolamento social provocou uma piora na qualidade de vida dos brasileiros. Isso aconteceu sobretudo nos meses das fases mais agudas de restrições. Entre os relatos, o consumo mais frequente de bebida alcoólica e de alimentos processados e ultraprocessados, somados à dificuldade em realizar atividades físicas, provocaram mudanças na saúde dos brasileiros e teremos que lidar com os desafios para reverter os prejuízos causados”, aponta o especialista.
Ele lembra que, anteriormente, campanhas de alerta sobre os malefícios do consumo de cigarros levaram a uma redução efetiva do tabagismo no país. Para o médico, este fato pode ser considerado uma das maiores conquistas da oncologia nos últimos 20 anos. Claro, para além dos avanços no desenvolvimento de novas medicações. Mas o trabalho está longe de acabar.
“Agora é o momento de redobrar nossos esforços para maximizar a disseminação de informações sobre os cuidados quando o assunto é sedentarismo e hábitos alimentares. Em especial diante dos desafios adicionais que surgiram com consequência da pandemia”, reforça Carlos.
Cada vez mais casos de câncer
No Brasil, segundo o Instituto Nacional de Câncer (Inca), 625 mil novos casos são diagnosticados todos os anos. A doença ocorre em parte pelo aumento da expectativa de vida. No entanto, há um volume considerável de diagnósticos ligados a fatores de risco evitáveis.
“A falta de atividade física e dietas desbalanceadas, com baixo consumo de fibras e excesso de gorduras, podem estar relacionadas a 50% dos casos de câncer de endométrio, 37% de câncer de esôfago, 25% dos tumores malignos do cólon e 20% das ocorrências de câncer de mama. Apenas para citar algumas estimativas trazidas por estudos feitos dentro e fora do país”, afirma o oncologista.
No âmbito global o cenário não é diferente. A Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (Iarc, sigla do inglês), entidade ligada à OMS informa que, nas duas últimas décadas, o número total de novos casos de câncer quase dobrou. Isto é, saltou de 10 milhões estimados em 2000 para 19.3 milhões em 2020.
As projeções do relatório Globocan 2020 indicam ainda que nos próximos anos há uma tendência de elevação dos índices de detecção do câncer. Estima-se que os níveis cheguem ao patamar de quase 50% a mais em 2040 em comparação ao cenário atual, quando o mundo deve então registrar algo em torno de 28.4 milhões de novos casos de câncer.
O número de mortes por câncer, por sua vez, subiu de 6,2 milhões em 2000 para 10 milhões em 2020. Essa equação aponta que a cada seis mortes no mundo, uma acontece em decorrência do câncer.
A atividade física é uma aliada da prevenção
Diferentes estudos científicos recentes reforçam a importância de adotar hábitos saudáveis para frear o avanço dos casos de câncer no Brasil e no mundo. Um deles, publicado em janeiro de 2022 na “Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical”, aponta que de 1999 até 2019, o aumento do sedentarismo e do índice de obesidade entre a população, derivado em grande parte ao crescente consumo de alimentos ultraprocessados e da ingestão alcoólica (que subiu 41%), contribuiu na elevação dos fatores de risco oncológicos.
Carlos complementa ainda que se exercitar impacta em um menor risco de desenvolver neoplasias. “Quando somos fisicamente ativos, estudos mostram que é possível reduzir os riscos de, pelo menos, 13 tipos de câncer. É um exemplo o de reto, bexiga, mama, sangue, entre outros”, destaca.
A mudança consequente de ajustes simples de hábitos de vida é de fato efetiva, como mostrou uma análise veiculada em outubro de 2021 na Medicine & Science in Sports & Exercise. A pesquisa, feita nos Estados Unidos, indica que uma caminhada rápida, de 45 minutos ao dia — totalizando cinco horas de exercícios moderados por semana — pode efetivamente reduzir o risco de câncer. Além disso, o exercício tem um impacto positivo na qualidade de vida da população geral, prevenindo ainda uma série de outras doenças.
E esses são apenas alguns dos exemplos práticos que reforçam a importância do combate ao sedentarismo, aponta o oncologista. Para quem busca afastar o risco de neoplasias, o médico aconselha uma mudança gradual da rotina, com as adaptações necessárias.
“É importante encontrar atividades que realmente goste e começar por exercícios mais leves e moderados, podendo aumentar a intensidade com o tempo. Até mesmo atividades simples do dia a dia, como subir escadas, passear com o cachorro ou levar os filhos à pé até a escola são maneiras de trazer movimento ao corpo. Além de uma rotina de exercícios, é muito importante que a população em geral adote uma dieta equilibrada, rica em frutas, legumes, proteínas e verduras e mantenha a hidratação sempre em dia”, orienta.
Pacientes oncológicos também se beneficiam dos exercícios
Para aqueles que já receberam o diagnóstico de câncer, a prática de exercícios físicos também pode trazer diversos benefícios. “Isso porque eles aumentam a atividade de algumas células do sistema imunológico, que podem atingir as células cancerígenas”, explica o Dr. Carlos.
“No caso das pessoas sedentárias, além do câncer, é bastante provável que ela possa desenvolver problemas metabólicos, diabetes, entre outros. Por isso, quando o organismo está fragilizado, ele sofre impactos no combate à neoplasia”, enfatiza o especialista.
Além disso, a prática de atividades físicas traz também uma sobrevida maior aos pacientes, além de reduzir o risco de metástases, pois há um aumento de substâncias inflamatórias no corpo que impactam diretamente no desenvolvimento descontrolado das células cancerígenas.
A somatória destes dados apontados resulta em um alerta importante: é preciso rever nossos hábitos de vida — ou a falta deles — para frear as estatísticas.
“O incentivo à prática constante de exercícios físicos, dieta equilibrada, consumo moderado de bebidas alcoólicas e outras medidas simples surgem não apenas como iniciativas essenciais para frear os índices aumentados do câncer, como uma maneira de promoção à qualidade de vida e bem estar geral. Essas medidas contribuem também para a potencialização do processo de tratamento para pessoas diagnosticadas com a doença e outras condições como diabetes e hipertensão”, finaliza Carlos.