O Brasil é o 5º país do mundo com o maior número de pacientes diabéticos. Ao todo, mais de 16 milhões de brasileiros têm diabetes, seja o de tipo 1 ou tipo 2 (mais comum). A doença é fator de risco para uma série de condições, bem como pode ser consequência de determinadas enfermidades.
Abaixo, especialistas explicam como o diabetes se relaciona com doenças que atingem todo o organismo. Confira:
Obesidade
Aproximadamente 20% dos brasileiros estão obesos, apontam dados da Abeso (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica). Vale destacar que a obesidade é uma doença crônica, e um dos principais fatores de risco para o desenvolvimento do diabetes tipo 2. Estudos mostram que pessoas com obesidade grave têm risco até 23 vezes mais alto de desenvolver diabetes do que aqueles cujo IMC é abaixo de 30.
“A obesidade contribui para a resistência à insulina, condição na qual as células do corpo não respondem adequadamente à insulina, levando ao aumento dos níveis de glicose no sangue. Além disso, o excesso de gordura, especialmente na região abdominal, está associado a inflamações crônicas e alterações hormonais que podem agravar ainda mais o risco de diabetes”, explica Andrea Pereira, médica nutróloga e cofundadora do Instituto Obesidade Brasil.
Controlar o peso por meio de uma alimentação balanceada e prática regular de exercícios físicos é fundamental para a prevenção do diabetes tipo 2. Isso porque pequenas mudanças no estilo de vida podem ter um grande impacto na saúde geral e na prevenção da doença. Segundo Andrea, perdas de 10% a 15% de peso auxiliam no controle da glicemia.
Além disso, a cirurgia bariátrica pode ser um dos caminhos para o tratamento dessa doença, já que estudos comprovam que esse procedimento auxilia no controle não só do diabetes, como também da pressão arterial.
Segundo o presidente do Instituto Obesidade Brasil, o cirurgião bariátrico Carlos Schiavon, pacientes submetidos à cirurgia conseguem um melhor controle do diabetes com menos medicamentos e, em alguns casos, atingem a remissão. Isto é, tem o diabetes sob controle sem medicação.
AVC
Pessoas com diabetes têm aproximadamente 1,5 mais chances de sofrer AVC do que indivíduos sem a condição. O neurocirurgião Victor Hugo Espíndola alerta que a doença não tratada é um dos fatores de risco para o derrame.
‘’Altos níveis de açúcar no sangue, além de danificar os vasos sanguíneos e os nervos, contribuem para o depósito de gordura nas artérias (conhecidas como placas ateroscleróticas), o que torna o AVC com mais probabilidade de acontecer”, alerta.
Dados da American Heart Association (AHA) mostram que cerca de 16% dos adultos com mais de 65 anos com diabetes morrem vítimas de um derrame (AVC). ‘’Quando o paciente tem ainda obesidade, pressão alta, é fumante e ainda não tem uma dieta saudável, a pessoa vira uma ‘bomba relógio’ para um AVC’’, alerta Victor Hugo.
Abaixo, o neurocirurgião lista algumas medidas que podem ser ajudar a prevenir o diabetes e, assim, um AVC:
- Alimentar-se de forma mais saudável como alimentos ricos em fibras, vitaminas e sais minerais;
- Praticar exercícios regularmente;
- Manter um peso saudável;
- Ter boas noites de sono;
- Evitar álcool e cigarro;
- Fazer avaliações médicas periodicamente.
Coração
Pelos mesmos motivos descritos acima, o diabetes mellitus é um fator de risco importante para o aparecimento de doenças cardiovasculares. Ou seja, se o indivíduo tem essa doença, a chance dele apresentar algum problema de coração como a angina e o infarto do miocárdio, é maior do que as pessoas que não têm a condição.
Segundo Bruna Miliosse, médica cardiologista do Hospital Icaraí, dentre as doenças do coração mais frequentemente associadas ao diabetes, estão a angina de peito, o infarto do miocárdio e a insuficiência cardíaca, dentre outros.
“Os sintomas podem também ser diversos e variar de doença para a doença, mas na presença de dor no peito, cansaço ou inchaço nas pernas, é recomendado que se procure um médico para uma avaliação clínica completa”, destaca.
Assim como Victor Hugo, Bruna também recomenda a adoção de um estilo de vida saudável para prevenir o diabetes e suas complicações. Isso inclui a prática de exercícios físicos regulares e de uma alimentação balanceada, rica em frutas, verduras, legumes e grãos integrais.
“O acompanhamento médico regular com o uso de medicações, caso sejam necessárias, também irá ajudar a cuidar do diabetes a fim de se evitar problemas de coração no futuro”, diz a médica.
Trombose
A cirurgiã vascular e angiologista da Venous reforça que diabetes contribui para problemas vasculares de várias maneiras, incluindo a trombose. Segundo ela, o diabetes mellitus, particularmente o tipo 2, está associado a várias alterações metabólicas e inflamatórias que afetam o sistema vascular. Essas alterações incluem:
- Hiperglicemia: níveis elevados de glicose no sangue podem levar à glicação das proteínas, resultando em produtos finais de glicação avançada (AGEs) que danificam os vasos sanguíneos e promovem a inflamação;
- Disfunção endotelial: o revestimento interno dos vasos sanguíneos, o endotélio, é crucial para a regulação da coagulação e do tônus vascular. Porém, a hiperglicemia crônica causa disfunção endotelial, aumentando o risco de formação de coágulos;
- Inflamação: o diabetes está associado a um estado inflamatório crônico, com níveis elevados de citocinas pró-inflamatórias que podem promover a aterosclerose e a trombose;
- Alterações na coagulação: o diabetes pode levar a um estado pró-trombótico, com aumento da atividade das plaquetas e dos fatores de coagulação, e redução da atividade fibrinolítica (a capacidade do corpo de dissolver coágulos).
Além disso, vários fatores de risco podem acelerar o surgimento de trombose em pacientes diabéticos. A médica aponta, por exemplo, hiperglicemia persistente, hipertensão, dislipidemia, obesidade, sedentarismo, tabagismo e histórico familiar.
Novamente, a especialista recomenda adotar um estilo de vida saudável para prevenir tais complicações, o que inclui controle rigoroso dos níveis de glicose e manejo de outros fatores de risco cardiovascular. São eles:
- Atividade física;
- Dieta balanceada;
- Controle da pressão arterial;
- Gestão do colesterol;
- Cessar o tabagismo;
- Perda de peso.
“É importante que pacientes diabéticos mantenham um acompanhamento regular com seus profissionais de saúde para monitorar e gerenciar os fatores de risco cardiovasculares. Além disso, a educação sobre o autocuidado e a importância da adesão ao tratamento são cruciais para a prevenção de complicações vasculares”, destaca.
Cegueira
Segundo o Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO), o diabetes é a principal causa da perda de visão entre pessoas de 20 a 64 anos. O oftalmologista Breno Marques, do Hospital de Olhos de Cuiabá (HOC) explica que a retinopatia diabética ocorre quando os altos níveis de glicose no sangue danificam os vasos sanguíneos da retina, a parte do olho responsável pela captação de imagens.
“Essa condição é uma das principais causas de cegueira em adultos em idade produtiva, e a sua prevalência está em ascensão. Estudos recentes indicam que cerca de 30% dos pacientes diabéticos desenvolvem algum grau de retinopatia diabética ao longo de sua vida”, alerta o especialista.
Tratamentos eficazes estão disponíveis para retardar a progressão da retinopatia diabética e preservar a visão. “Dependendo do estágio da doença, podemos utilizar técnicas como a fotocoagulação a laser, que direciona feixes de luz para selar os vasos sanguíneos vazados, ou a terapia antiangiogênica, que inibe o crescimento anormal de novos vasos sanguíneos”, explica o especialista do HOC.
Para prevenir a perda de visão em decorrência do diabetes, o médico recomenda:
- Manter os níveis de açúcar no sangue dentro da faixa recomendada pelos profissionais de saúde;
- Controlar a pressão arterial e os níveis de colesterol;
- Realizar exames oftalmológicos ao menos uma vez por ano para detectar a retinopatia diabética precocemente.
Diante do aumento alarmante da prevalência da retinopatia diabética, o oftalmologista alerta para a necessidade de educação e conscientização. “É preciso atenção, informar os pacientes sobre os riscos da retinopatia diabética e incentivá-los a buscar cuidados oftalmológicos regulares”, destaca o profissional.
Audição
O diabetes também contribui para a perda auditiva. Segundo Ariane Gonçalves, audiologista e especialista em saúde auditiva da AudioFisa Aparelhos Auditivos, e autora do Livro: Descomplicando a Perda Auditiva, relação entre diabetes e perda auditiva é complexa e ainda está sendo investigada, mas existem algumas teorias sobre como isso ocorre.
A especialista cita, por exemplo, microangiopatia, neuropatia, desequilíbrio metabólico, estresse oxidativo e inflamação. Ariane lembra ainda que o risco aumenta conforme a idade, bem como com a presença de complicações associadas à diabetes, como hipertensão e dislipidemia.
Para prevenir problemas auditivos, os pacientes diabéticos devem adotar as seguintes medidas:
- Controle glicêmico rigoroso: manter os níveis de glicose no sangue dentro das metas recomendadas pelo médico pode ajudar a prevenir danos aos vasos sanguíneos e nervos auditivos;
- Monitoramento regular da audição: realizar exames auditivos periódicos para detectar e tratar problemas auditivos precocemente.
- Estilo de vida saudável: adotar uma dieta balanceada, praticar atividade física regularmente, evitar fumar e consumir álcool com moderação.
- Controle da pressão arterial e do colesterol: manter a pressão arterial e os níveis de colesterol sob controle pode ajudar a reduzir o risco de complicações vasculares que afetam a audição.
- Evitar exposição a ruídos altos: proteger os ouvidos de ruídos altos e prolongados, que podem exacerbar a perda auditiva;
- Medicamentos e suplementos: seguir as recomendações médicas para o uso de medicamentos e considerar o uso de suplementos antioxidantes, conforme orientação do profissional de saúde.
“Essas medidas podem ajudar a reduzir o risco de perda auditiva e melhorar a qualidade de vida dos pacientes diabéticos”, finaliza a especialista.
Infertilidade e problemas na gestação
O diabetes pode afetar a saúde reprodutiva da mulher e do homem. Segundo explica o Dr. Roberto de Azevedo Antunes, especialista em reprodução assistida e diretor médico da Fertipraxis Centro de Reprodução Humana, o aumento da resistência insulínica pode levar a um quadro de anovulação (ausência da ovulação) crônica. Em quadros mais graves de descompensação da doença, a mulher pode até parar de menstruar.
“Além disso, a mulher diabética, quando se torna gestante, o risco de descompensação na gravidez é maior, o que pode piorar no controle clínico da doença com risco de uma série de malformações do bebê em decorrência das altas taxas de açúcar no sangue durante a gravidez. Nesses casos, há o risco de o bebê nascer com tamanho maior ou mais chances de entrar em sofrimento fetal no final da gestação”, alerta.
Já os homens com diabetes podem perder qualidade e produção de espermatozoides levando a um quadro de redução da fertilidade e da capacidade produtiva. Portanto, é importante controlar o quadro da doença principalmente de pacientes mais jovens, destaca Roberto.